Untitled Document
 
 

Untitled Document

 
 
 
Untitled Document

Agenda de Dezembro

 


Cartazes das
Bienais
dos anos 50

Artistas ligados
 aos cursos de artes gráficas criados pelo
Instituto de Arte
Contemporânea do Masp - o IAC -  criam os primeiros Cartazes das Bienais
Heloísa Dallari

 

História das Bienais

A Vez dos Curadores
Na Parte 5 do ensaio
História das Bienais, a antropóloga Rita de Cássia Alves Oliveira mostra o surgimento da figura poderosa dos curadores das bienais.

 

Acre,
último seminário
da 27ª Biena
l



As questões sociais dos
indígenas e seringueiros
foram a tônica do
Seminário Acre

 

No Centro Universitário
Maria Antonia
prepare-se para ouvir
John Cage

Untitled Document
crônicas de Tarsila do Amaral

Lembranças de Paris nas crônicas
de Tarsila do Amaral

Laura Taddei Brandini[1]


Carnaval em Madureira, de 1924

 

                       Tarsila do Amaral, em Carnaval em Madureira, materializa com formas geométricas européias e cores brasileiras a dicotomia nacional/strangeiro que pautou o Modernismo brasileiro: ela planta a Torre Eiffel, símbolo maior de Paris, entre os morros e as gentes do Rio de Janeiro, fundindo em ritmo de samba as duas culturas. Ao fazê-lo, Tarsila representa de forma inigualável o caminho até então percorrido pelos intelectuais brasileiros em busca de uma identidade nacional. Caminho esse que, necessariamente, passava pela França.

                      Quando, em 1922, explode a Semana de Arte Moderna e surgem, durante os anos vinte, seus desdobramentos sob a forma de movimentos identitários, a nova geração de intelectuais mais uma vez volta seus olhos para a França, assim como o fizeram antes os românticos. O país independente sentia a necessidade de se descobrir enquanto tal e, para tanto, na busca de suas origens, acabava sempre se encontrando projetado no outro, visto pelos olhos europeus, os primeiros a retratar o Brasil, seja na literatura, seja nas artes visuais.

                      Nesses olhares entrecruzados, também intelectuais brasileiros viajaram em busca dos conhecimentos de que o jovem Brasil necessitava a fim de tentar ao menos diminuir a distância existente entre a metrópole cultural e o país selvagem e belo, que a elite, de origem européia, lutava por domar.

                      Dessas inúmeras travessias pelo Atlântico através dos séculos nasceram os mediadores que desempenharam papel decisivo na consolidação da cultura brasileira. Seja simplesmente buscando atualizar seus conceitos estéticos – o que já configura uma tentativa de inserção do país na tradição artística européia –, seja refletindo sobre os valores nacionais, integrando-os em suas obras, os artistas mediadores estreitaram as relações entre o Brasil e a França, fazendo dela a “pátria de adoção” de muitos intelectuais.

                      Tarsila do Amaral foi uma dessas ilustres figuras. Nascida e criada no seio da aristocracia cafeeira paulista, aprendeu desde pequena a amar a França. Seu cotidiano na fazenda era repleto de galicismos, como ela mesma se lembra:

                      “Cresci numa fazenda de café como a cabrita selvagem, saltando daqui para alí entre rochas e cactos.
Mas quando voltava para casa encontrava ao piano uma criatura irradiando beleza: era minha mãe tocando Couperin ou Dandrieu.
                      (...)
                      Logo mais, quando não conseguia fugir, Mademoiselle Marie, a professora de vinte anos que morava na fazenda, chamava para a lição de francês. Então a minha cabritice revoltava-se porque eu queria era saltar pelas pedras ou procurar maracujá no mato próximo.
                      (...)
                      Às últimas horas do dia, depois do banho com sabonetes parisienses, a fim de aproveitar os derradeiros momentos de brincadeiras, minha mãe tocava ao piano a Marselhesa e eu marchava com meus irmãozinhos para o quarto de dormir, cantando: ‘Allons enfants de la patrie ...’ ”[2]

                      Posteriormente, decidida pela carreira artística, é para Paris que Tarsila parte, sedenta de atualização técnica. Depois do batismo modernista, em São Paulo, ao integrar-se ao meio artístico efervescente da cidade que reverenciava no início do século XX a arte negra e tudo o mais o que fosse exótico aos olhos europeus, a pintora, assim como outros intelectuais, também passa a realizar o exercício de retorno à origem, produzindo obras que representam seu país em temática e colorido, ao mesmo tempo em que incorporam elementos da técnica cubista.

                      Passados alguns anos, na década de trinta, Tarsila inicia uma série de colaborações para a imprensa paulista e carioca. A pintora, então, passa a ser também autora de crônicas, publicadas entre 1936 e 1956, tendo por tema, sobretudo, lembranças sediadas na Paris da década de vinte, a divulgação de conhecimentos adquiridos por meio de leituras – quase sempre francesas – e acontecimentos do mundo artístico-cultural brasileiro. Neste artigo, trataremos brevemente da relação entre Tarsila e a cultura francesa por meio da análises de algumas de suas crônicas memorialistas.

                      A artista fez sua primeira viagem a Paris ainda criança, quando se desiludiu com a cidade, que não correspondeu às expectativas criadas por sua imaginação infantil. Composta por ambientes advindos de contos de fadas, a Paris da menina Tarsila era um mundo à parte, maravilhoso, e que já refletia o deslumbramento causado pela cidade à criança, traduzido em imagens pueris:

                      “Eu era menina quando vi Paris pela primeira vez. Que desilusão! Seria aquela a tal cidade das maravilhas de que tanto se falava? Onde seus palácios rodeados de parques de esmeraldas em cujos lagos tranqüilos bandos de cisnes nadavam serenos e majestosos? Onde as donas Sanchas cobertas de ouro e prata, resplandecentes nas suas carruagens crivadas de brilhantes? Onde as ruas ladeadas de solares translúcidos, irisados, nos quais príncipes encantados habitavam com seus pagens formosos, vestidos de damascos e veludos?”[3].

                      Já adulta, voltou à capital em 1920 e, seguindo indicação do professor de pintura Pedro Alexandrino, foi estudar arte acadêmica na Académie Julian. Conforme carta enviada à amiga Anita Malfatti, datada de 14 de setembro de 1921[4], a artista já estava atenta aos movimentos de vanguarda artística, mas ainda não os compreendia bem e muito menos os assimilava em sua arte.

                     (E-D) Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral, Yvette Farkou, Fernand Lèger, Constantin Brancusi. Coleção Biblioteca do MAM/SP


                     Tarsila realmente mergulhou no burburinho da vida artístico-intelectual parisiense a partir de sua segunda longa estada em Paris. Esta se iniciou em dezembro de 1922 e sobre ela a própria artista afirmou diversas vezes: “Paris, o verdadeiro Paris, que me deixou impressões indeléveis, foi o Paris de 1923”.[5]

                      Em suas crônicas, Tarsila transporta para as páginas de jornal o clima crítico e festivo de renovação intelectual promovido pelo choque entre as diversas correntes artísticas que convergiam para Paris. Com uma linguagem solta, fluida, as lembranças aparecem encadeadas, formando um quadro colorido, alegre, vivo. Pelas mãos de Tarsila, o leitor é conduzido pela porta da frente às festas e recepções da mais alta vanguarda intelectual radicada em Paris. E a artista se encarrega de pô-lo a par das “últimas”, como numa deliciosa conversa sussurrada ao pé do ouvido. É dado a ele conhecer as manias de alguns artistas, como a de Blaise Cendrars, que dizia freqüentar somente lugares onde sua cachorrinha Volga pudesse entrar[6]; os projetos utópicos, como a “Cidade dos Artistas” do pintor Robert Delaunay, a ser construída num subúrbio de Paris[7]; as fofocas e briguinhas de então, como a que provocou a seguinte frase da pintora Marie Laurencin, por ela repetida nas rodinhas de artistas, e reproduzida pela autora em uma de suas crônicas: “Lhote a chipé mon éventail”[8].

 

Páginas 1|2|

   

 

 

Untitled Document